Tenho lido com frequência sobre "estarmos no mesmo barco", quando alguns colegas fazem seus escritos em defesa da Educação Digital ou aulas online, ao que me parece, orientados apenas pela bitola da restrita realidade em que estão inseridos profissional e/ou socialmente.
O que ocorre é que o momento inusitado e inédito para as gerações que ora coabitam o planeta, exige sim novos paradigmas, e não apenas no tocante à Educação, como também na Economia, na Arte e na Cultura, relativamente ao campo da diversão e do entretenimento; na Saúde Pública ou privada; e ainda, na forma como enxergamos e convivemos com outro e a própria visão de Vida, sobre o que importa e contribui positivamente para a edificação de todos nós, tornando-nos mais empáticos e gratos.
Fato é que o advento do vírus retirou de sobre nossos olhos e escancarou aos nossos olhares, verdades que ainda estamos nos esforçando para não ver.
O eterno "país do futuro", de dimensão continental, tem mais de 20 milhões de pessoas vivendo em vulnerabilidade financeira e social. São 9 milhões de crianças e adolescentes até 14 anos em situação de pobreza extrema. Para parcela expressiva de brasileiros, saneamento, saúde e educação básicas, direitos assegurados pela constituição, assim como energia elétrica, ainda são sinônimos de luxo.
Então, podemos, indubitavelmente, estar na mesma tempestade, porém, no mesmo barco, certamente, não.
Alguns vivenciam esse enfrentamento num navio de cruzeiro, repletado de facilidades e confortos, pequenos ou não. Outros em rebocadores, e a esmagadora maioria, em pequenas e frágeis embarcações ou até mesmo jangadas, à mercê tanto da turbulência, quanto da proteção alheia.
Sendo a EDUCAÇÃO um DIREITO de TODOS, será JUSTO que apenas os que vivenciam estes tempos de imprecisão, amparados por navegações precisas, guarnecidos de acessibilidade digital e suporte profissional à distância, além de respaldo social e econômico, dele desfrutem, dando azo a que se amplie o abismo entre classes?
Beneficiar alguns em detrimento de outros, para entregar conteúdo, em tentame vão de cumprir grades curriculares só faz enfatizar a desigualdade educacional e social, já tão pungentes neste nosso Brasil. Os danos psicoemocionais causados pela desigualdade e discriminação, inferiorizam; mortificam almas; aniquilam sonhos, embotam a criatividade e acabam, muitas vezes, por fomentar revolta a traduzir-se em violência.
Recebemos, todos nós, de presente, um vírus. Talvez seja a oportunidade que precisávamos para resetar nossos modelos obsoletos de sociedade, economia, justiça, cultura, saúde, educação, e reconfigurá-los pela bitola da JUSTIÇA, a única virtude que nos iguala a todos.